terça-feira, 29 de dezembro de 2009

continue lendo sem pressa e com muita atenção que estou te levando para dentro da minha cabeça. assim mesmo... continue. a qualquer momento vamos mergulhar e já estaremos dentro. não existe meio termo, ou se está dentro ou se está fora. continue lendo sem parar que quando menos perceber estará dentro da minha cabeça e talvez entenderá alguma coisa. a intenção é essa. eu não sei quando devemos mergulhar. não depende de nós. simplesmente acontece. continue lendo com calma. parece que está quase. está ficando mais forte, consegue sentir? não pare de l...

nada nada nada nada nada nada nada nada
vaziovaziovaziovaziovaziovaziovaziovaziov
brancobrancobrancobrancobrancobrancob
pretopretopretopretopretopretopretopret
coloridocoloridocoloridocolorido colorido...

tenho medo de que a vida seja um sonho
tenho medo de acordar e não lembrar de nada
e o pior é que nunca sabe-se quando um sonho vai acabar
mas um sonho sempre faz parte do real
mesmo assim, sempre é difícil deixar alguma coisa para trás.
sempre que se acorda, o sonho parece mentira
e o agora sempre parece mais verdade
então, teoricamente, eu não deveria sofrer
pois o único sofrimento sempre é a ansiedade
o único sofrimento é separar o sonho do real
eu não devia me preocupar com isso, eu sei
mas sempre é difícil mudar, acordar, esquecer
só espero que isso não me enlouqueça, me acorde ou me mate;
ou melhor.. não espero nada.

nada nada nada nada nada nada nada nada
vaziovaziovaziovaziovaziovaziovaziovaziov
brancobrancobrancobrancobrancobrancob
pretopretopretopretopretopretopretopret
coloridocoloridocoloridocolorido colorido...


voltou?
e aí?

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

medo do medo

era uma vez uma criança
que chegou no parquinho e viu um escorregador
nele havia um monte de outras crianças escorregando sorridentes
parecia emocionante
e a criança, é claro, ficou com muita vontade de escorregar

mas quando sua mãe bateu os olhos nas crianças
descendo aquele escorregador a toda velocidade e caindo na areia
disse:

"vou ficar aqui sentada.
pode brincar na areia,
mas nem pense em ir no escorregador. é perigoso. "

a criança então obedeceu e ficou sentada na areia
mas com os olhos fixos no escorregador

enquanto isso, a mãe conversava ao telefone como se nada estivesse acontecendo.

medo

era uma vez uma criança
que chegou no parquinho e viu um escorregador
nele havia um monte de outras crianças escorregando sorridentes
parecia emocionante
e a criança, é claro, ficou com muita vontade de escorregar

correu e entrou na fila
esperou ansiosa
subiu as escadas de ferro
sentou no escorregador
olhou lá para baixo...
e sentiu medo

sentiu muito medo
mas não havia mais como voltar atrás
a fila estava cheia
e as crianças gritavam ansiosas na fila e empuleiradas na escada:

"desce logo, vai logo, rápido..."

ela respirou fundo
e com um só impulso
desceu de uma vez

sentiu um frio gostoso na barriga
e depois de cair sentada na areia
sorriu e voltou pro final da fila.


quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

rima besta

as coisas são muito suaves
ou rápidas demais
o sol sumiu e já é noite
tudo que era futuro ficou para trás

as coisas as vezes são lentas
não sei se por sorte ou azar
sei que não tenho muito controle
e as vezes prefiro não pensar

as coisas são terrivelmente comuns
e as vezes tão imprevisíveis
posso ligar a televisão e ver teletubies
ou morrer de ansiedade vendo o irã testar mísseis

tem dias que nem camomila me faz dormir
outros dias só acordo depois das duas da tarde
um dia pode passar inteiro sem eu nem perceber
e um segundo as vezes demora uma eternidade

as coisas são completamente loucas
e eu, idiota, ainda insisto em pensar, em querer saber
tem dias, por exemplo, que odeio rimas
e outros dias, sem mais nem menos, elas saem até sem eu querer









sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

por onde andam meus sonhos enquanto estou aqui parado sem nada poder?

podem estar andando pelas ruas tentando não pensar em nada ou trancados em casa com os olhos fixos na televisão. podem estar passando fome, sede, frio. podem ter sido violentados, sequestrados. podem estar sentados em um ponto de ônibus esperando a sorte e suas conseqüências breves. podem estar junto com notas fiscais no bolso da calça de ontem ou bêbados e sorridentes com novos amigos. podem ter sido atropelados. podem estar mortos. ou podem estar apenas me ignorando.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

outra ilha chamada quimera

não sei como vim parar aqui
as vezes gostaria muito de nunca ter pensado nisso
outras vezes me sinto muito esperto por pensar
as vezes acho que nunca pensei
as vezes tenho certeza
mas na maioria das vezes tenho dúvidas

uma ilha chamada quimera

não sei ao certo como as intenções saem ou chegam aqui
não sei bem como faço para lembrar ou para esquecer
as vezes tudo parece tão sob controle do acaso
outras vezes acho que tenho tudo sob controle
muitas vezes acho que sou um idiota
outras vezes tenho certeza

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

florilégio

flor
flora
floração
florada
floral
florão
floresta.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009


cantiga de roda

sem lembrar
sem prever
sem achar o que vai ser
sem buscar, remoer
sem motivo
sem sentido
como tudo tem que ser.

domingo, 15 de novembro de 2009

movediço

o coração
além de não parar
precisa acelerar
e depois desacelerar
os pulmões
além de não pararem
precisam parecer pequenos
e depois funcionarem distraídos
o mundo
além de não parar
precisa congelar, derreter
anoitecer e amanhecer
as árvores
além de não pararem
precisam dar sombra
frutos e flores
as nuvens
além de não pararem
precisam chover
e formar desenhos
o pensamento
além de não parar . . .
não sei do que os pensamentos precisam.

aceitar o absurdo.

de perto, quando se olha distraído, sem muito foco, sem muita idéia do que se passa, tudo parece tão natural, que nem se quer imaginamos. de longe, sem sentir as variações de temperatura, sem sentir os calafrios, sem sentir a falta de ar, sem sentir taquicardia e sudorese, bem longe das noites acesas e das sensações mais movediças, as coisas não parecem tão devastadoras, e nada mais fazemos, a não ser imaginar. mas, quando se está dentro, sentindo a realidade roer os osso, quando os olhos passam a desconfiar, quando tudo passa a ser, de fato, possível, tudo o que resta é aceitar.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

as coisas

era uma vez
um grupo de três
um era de vez
um pensava talvez
e o outro tinha certez

de vez
talvez
certez

quem sabe?

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

o eco do silêncio

o eco do silêncio silencia. ciranda de escarros, marteladas, combustão. ciranda de gigantes que gritam e pulam de cabeça. as horas lentas e os anos correndo. dias quentes, noites claras e sem estrelas. nos meus pulmões já não cabem toda a minha pressa. horas lentas e vidas intactas, sem nem ao menos coragem de morrer. nos meus olhos já não cabem tantas cores. é tanto ruído que o silêncio grita. de tanta apatia só restou memória.

o eco do silêncio silencia, e uma música que nasce do silêncio é muito mais bonita.


sexta-feira, 6 de novembro de 2009

quadrado quadrado quadrado quadrado
retângulo quadrado retângulo quadrado
quina e cantos planos e canos quina e canos planos
eletricidade plástico eletricidade plástico fios e fios
barulho barulho barulho barulho barulho barulho
asfalto concreto asfalto concreto asfalto e concreto
cinza preto branco cinza branco preto cinza cinza
cinza cinza cinza cinza fogo fogo fogo calor calor calor
fogo cinzas fogo cinzas fogo cinzas fogo cinzas fogo cinzas
calor asfalto cinza quadrado retângulo calor concreto
calor concreto calor concreto calor concreto calor concreto
quadrado quadrado quadrado quadrado.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

de lados opostos nossas vidas andam sussurrando vontades. nos ouvidos alheios tentamos nos livrar das carências e certezas, mas nós mesmos não acreditamos nem na verdade, nem na mentira inteira; nem na pergunta, nem na apatia, tenho quase certeza. tentamos então segurar uns nos outros, sussurrando alguma possibilidade, falando baixo, olhando reto, ouvindo pouco, vivendo longe de qualquer lugar. vivendo certo, pois é a única possibilidade.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

sábado, 24 de outubro de 2009

anti-édipo.

as coisas são exatamente como devem
as coisas foram exatamente como deveriam
as coisas serão exatamente como sempre foram, únicas e certas.

aleatório.

tão aleatório que parece a sorte, e a sorte ainda é a mais justa das opções. as opções nunca são suficientes e sempre sobra um espaço. no fundo do armário não tem nada de tão interessante.
e acho que nenhuma memória é digna de ocupar um espaço atoa. a memória ocupa o lugar que sobra, e nada além disso. se não sobrar espaço no armário, na cabeça, no coração etc, lamento, mas acho que tudo desaparece na linha do tempo, e a linha do tempo é imaginária e infinita.
e nada é mais seguro que o infinito e a imaginação.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

chicletes perdem o gosto muito rápido
são até bons no começo
mas depois dão dor na boca
parece até beijo longo de namoro que ja passou da validade
chicletes disfarçam a fome
mas não fazem bem pro estômago
e depois que perdem o gosto, são jogados no chão e ainda agarram no sapato.



quarta-feira, 7 de outubro de 2009

a paixão nos mata e nos move
e não da para fugir do movimento e nem a morte.
o movimento pode ser suave, lento, ondulado e sinuoso.
ou pode ser forte, duro, reto, certo...
pode ser discreto
pode ser espalhafatoso
pode ser de qualquer jeito
e sempre pode ser doloroso e prazeroso
de qualquer forma mata
porque qualquer direção é movimento.







segunda-feira, 5 de outubro de 2009

pelas ruas da cidade

I
eram 10 horas da manhã. ele usava um calção desbotado com listras marrons e brancas, e por baixo de uma barba grande e empoeirada ele se lavava na torneira de um canteiro da cidade. usava um sabão de coco que já estava bem perto do fim, mas ainda fazia bastante espuma; passava as unhas entre os pelos grossos do rosto, lavava entre os dedos dos pés e atrás da orelha, sempre com muita espuma. depois de estar todo ensaboado ele se enxaguava com uma caneca de plástico verde. pegava a água na torneira e jogava sobre a cabeça repetidas vezes até tirar completamente a espuma. depois que estava limpo, pegava sua toalha de rosto branca e se secava. depois de se secar, lavava a toalha com o resto do sabão, torcia bastante, dava umas batidas no ar e a deixava pendurada na torneira enquanto ia se pentear. ele tinha um pedaço de espelho pequeno e um pente de plástico marrom. penteava o cabelo para trás e passava o pente na barba e no bigode com paciência. depois de penteado, recolhia suas coisas, as guardava na mochila do perna-longa e procurava algum banheiro público pra colocar uma roupa mais apresentável. depois de limpo e vestido ele ia procurar almoço, pois já eram 11e30 e sua barriga roncava.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

pensar em deus é desobedecer a deus
porque deus quis que não o conhecêcemos
por isso se nos não mostrou...

sejamos simples e calmos,
como os regatos e as árvores
e deus amar-nos-á fazendo de nós
nós como as árvores são árvores
e como os regatos são regatos,
e dar-nos-á verdor na sua primavera,
e um rio aonde ir quando acabermos
e não nos dará mais nada,
porque dar-nos mais seria tirar-nos mais.


(alberto caeiro)
só a natureza é divina, e ela não é divina...
se às vezes falo dela como de um ente
é que para falar dela preciso usar a linguagem dos homens,
que da personalidade às cousas,
e impõe nome às cousas.
mas as cousas não têm nome nem personalidade:
existem, e o céu é grande e a terra larga,
e o nosso coração do tamanho de um punho fechado...
bendito seja eu por tudo quanto sei.
é isso tudo que verdadeiramente sou.
gozo tudo isso como quem sabe que há o sol.



(alberto caeiro)
falas de civilização, e de não dever ser,
ou de não dever ser assim.
dizes que todos sofrem, ou a maioria de todos,
com as cousas humanas posta desta maneira.
dizes que se fossem diferentes, sofreriam menos.
dizes que se fossem como tu queres, seria melhor.
escuto sem te ouvir.
para quê te queria eu ouvir?
ouvindo-te nada ficaria sabendo.
se as cousas fossem como tu queres, seriam só como tu queres.
ai de ti e de todos que levam a vida
a querer inventar a máquina de fazer felicidade.




(alberto caeiro)
um dia de chuva é tão belo como um dia de sol.
ambos existem, cada um como é.


(alberto caeiro)

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

autofagia.

tão livre e com tanto medo do óbvio
tão só e com tanto medo da solidão
tão junto e com tanto medo da multidão
tão pouco e com tanto medo do nada
tão tudo e com tanto medo do eterno
tão mau e com tanto medo do inferno
tão lento e com tanto medo do estático
tão louco e com tanto medo da loucura
tão rápido e com tanto medo do futuro
tão santo e com tanto medo de deus
tão sóbrio e com tanto medo da realidade
tão puro e com tanto medo da virgindade
tão cético e com tanto medo da relatividade
tão desapegado e com tanto medo da saudade
tão contraditório e com tanto medo da verdade.

domingo, 20 de setembro de 2009

liberdade é esquecer de estar preso.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

breguices de um coração desgraçado IV

hoje sonhei com você.

breguices de um coração desgraçado III

quando acordei no dia seguinte não lembrei nem se havia sonhado. foi quando pensei que a expectativa acaba com qualquer sonho (se ainda estiver acordado).

breguices de um coração desgraçado II

"eu não vou negar que sou louco por você. estou maluco pra te ver, eu não vou negar."


no meio da madrugada de ontem eu sonhei com você, acordei assustado e muito angustiado por saber que era um sonho e que você ainda estava longe. ofegante, levantei e fui até a cozinha beber um copo de água enquanto tentava relembrar o sonho. era algo óbvio, mas eu não lembrei. deitei de novo fazendo força pra voltar a sonhar o mesmo sonho. foi quando pensei que todos sonhos, por mais óbvios, bons ou ruins que possam ser, valem a pena se te fazem acordar ofegante e com o coração acelerado.

breguices de um coração desgraçado.

eu andava com medo de morrer de dor, e, ao mesmo tempo, tinha medo de que a dor não me matasse e só fizesse mesmo sofrer. desisti do amor! agora ando fazendo força pra não morrer de dor e de saudade e, além do medo de morrer e de não morrer, tenho medo de enlouquecer.

domingo, 13 de setembro de 2009

sinto muito
não sinto nada
sinto muito
não sinto nada
sinto muito
não sinto nada
sinto muito
não sinto nada

sinto muito por nada sentir.
em terra de cego quem tem olho é louco.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

sobreposição de paixões

é que na falta de certeza, prefiro um punhado de meias verdades.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

cinco horas da manhã

agora parece tarde, mas já é cedo.
de algum começo que não sei qual de algum pedaço que mordi e me desceu mal de algum amargo que temperei com sal de qualquer sábado domingo feriado nacional. de hoje em diante, de longe o bastante para esquecer e mudar o semblante por um pequeno estante que pareça verdade daqui para onde não sei a idade do mundo não sei se meu pé toca o fundo do mar ou de qualquer lugar que me faça esquecer de pensar e pensar e pensar e pensar e pensar. pode ser que seja daqui que recomece a sentir o gosto da vida da salada do almoço do osso roído aparentemente insosso mas a água já bate no pescoço e a maré vai subindo independentemente do meu esforço. se essa fruta tem caroço eu sou obrigado a morder mais fundo esperar secar cavar profundo plantar e semear algum fruto morder e achar saboroso.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009







ninguem nasce pela metade,
ninguem morre pela metade,

pela metade, é melhor nem viver.
pensar em determinada direção já é mais da metade do caminho percorrido.
pelo menos é assim que tenho visto as coisas.
e, se isso é verdade, tenho percorrido muitos caminhos,

preciso pensar menos;
ou então aprender a me contentar com um monte de caminhos incompletos.
não nascemos um para o outro,
e, ainda assim, as vezes, acho que poderia morrer de amor por alguém ou por alguma coisa.
mas só de pensar que morreria sozinho, desisto de pular.

não morremos um pelo outro,
e, mesmo assim, as vezes, acho que nasci para alguém, ou para alguma coisa.
mas só de pensar que nasceria sozinho, aborto.

não vivemos um para o outro,
mas, as vezes, ainda acho que só existimos morrendo de amor
vez ou outra ainda acho que nascemos para amar.
mas só de pensar em amar, nasço e morro um milhão de vezes.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

falso moralismo

não tenha, seja.
não seja, sinta.

não pense, ame.
não ame, esqueça.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

o alienado teimoso e o cético chato.

sim, ainda estou olhando para a mesma pedra. sim, ainda acho que ela vai se mexer. e, nada que você disser me fará desviar o olhar. vou ficar aqui pelo resto da minha vida com o olhar fixo e ansioso. cara, por quê isso te incomoda tanto? não adianta mudar o método, mudar os objetivos, resultados. não adianta mudar as regras, não adianta ganhar prêmios; vou continuar olhando fixamente para essa pedra. sim, a mesma pedra. o que posso fazer? eu sinto que ela vai se mexer. sei que parece absurdo. todo mundo sabe disso; mas, desculpe, não posso fazer nada. eu acredito, eu sinto, e vou passar o resto da minha vida esperando. desculpa a pergunta, cara, mas você já se apaixonou?

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

a realidade é feita de memórias contrapostas com o presente.
se não existe memória, não existe realidade.
se eu não lembro mais de você,
se eu já não penso mais em você,
é porque você não existe mais.

aceitamos o simples para sofrer menos.


segunda-feira, 17 de agosto de 2009

caralho! pensar é pior do que cigarro.



cansado de envelhecer
cansado de amanhecer
mas tudo sempre anoitece, esfria e fica difícil de ver
mas tudo sempre volta no horizonte com cores quentes, sobe até o topo e depois se acalma.

boa tarde.


olhar para dentro
dentro
dentro
dentro
dentro

olhar para longe
longe
longe
longe
longe

tudo parece tão longe
dentro
dentro
dentro
dentro

tudo parece tão dentro.
longe
longe
longe
longe



se isso fosse mesmo necesário eu não teria que usar óculos.

domingo, 2 de agosto de 2009


o rio e as pedras.

no meio do fluxo da correnteza do centro da cidade ele sentiu uma vontade súbita de olhar para o céu. sentia vontade mas parecia não ter coragem. era final de tarde e as pessoas pareciam apostar corrida para chegar em seus lares. parou no canto da calçada e algumas pessoas esbarravam no seu ombro como as águas de um rio empurram as pedras que param. sentiu-se travado. o rio parecia determinado a arrastá-lo correnteza abaixo e ele continuou andando. fazia calor. ele usava calça, sapatos e uma blusa social de manga comprida cor azul-marinho como exigia seu emprego. seu corpo e seus pensamentos se encontravam num cansaço acumulado que refletia claramente nos seus olhos opacos. ouvia-se um barulho único feito de vozes, gritos, passos, respirações pesadas, motores e buzinas. via-se também uma cor única formada por roupas multicoloridas, pessoas multicoloridas, carros multicoloridos, um asfalto e paredes cinzas. por mais que ele quisesse, ao fim de mais um dia, se abster de qualquer pensamento, uma vontade agora constante o fazia querer olhar para o céu. então parou no canto da calçada novamente. dessa vez mais seguro, ele colocou a mão na parede descascada de uma loja de eletrodomésticos empueirados, fechou os olhos, suspirou profundamente e olhou para cima. por mais que os edifícios quisessem, numa perspectiva até o infinito, tapar o céu, ele ainda estaria lá, azul e sublime com suas nuvens borradas de branco acinzentado de final de tarde. ele ignorou os edifícios, fixou os olhos no céu, e, de uma só vez todas as multicores que o enchiam de direções e o entupiam de sensações, deram lugar ao azul claro que o fazia piscar os olhos agora com calma e respirar mais suavemente. os barulhos sumiram e ele sorriu com uma respiração profunda de alívio; sentiu um calafrio bom pelo corpo e o calor também deu lugar à uma brisa suave de final de tarde; sentia-se como alguém que chega à superfície da água depois de quase morrer afogado; sorria como bobo; sorria como quem não acreditava e descobre. uma mulher, com o mesmo olhar de final de expediente, corpo cansado e saturado de tanto acúmulo, passava por ele na mesma calçada. o viu olhando para cima e sorrindo, e, mesmo sem saber o porquê, também olhou curiosa. num instante os dois estavam como duas crianças rindo com os olhos fixos no céu. outras pessoas que também passavam perto ficaram curiosas e olharam; e descobriam, uma a uma, o alívio do não afogamento. mais um instante e já eram 7 pessoas olhando para o céu e rindo. logo eram 15. as pessoas saíam curiosas das lojas; outras colocavam a cabeça para fora dos carro, dos ônibus, das janelas dos edifícios. mais um instante e um quarteirão inteiro de pessoas estava parado e rindo. o rio estava parado. o rio estava parado! mais um instante,e , devagar as pessoas foram abaixando a cabeça, sentindo-se apressadas novamente e voltavam a andar. num instante seguinte o fluxo corria novamente como há dois minutos atrás. as multicores, o som único de todas as coisas acumuladas, o cansaço corporal e mental, a vontade de chegar em casa; tudo ia voltando. o rio voltara a correr normalmente. o rio voltara a correr novamente!

quinta-feira, 30 de julho de 2009

quarta-feira

madrugada, chovia, e da rua de paralelepípedos podia-se sentir o cheiro de pedra e terra molhada que tornava o clima ainda mais úmido. no canto da rua havia um amontoado de entulhos (caixas de papelão, latas, telhas etc) que sobravam da construção do final da rua. dentro de uma dessas caixas de papelão dormia gomes, um cachorro grande e preto. gomes era solitário e gostava disso. alguns diziam que ele era apenas orgulhoso e que não passava de um cachorro calado e triste. gomes tinha um olhar sério e um latido suave e grave. era dócil e quando se sentia feliz abanava o rabo como uma criança. não era triste nem orgulhoso, era apenas calmo e preguiçoso. gomes tinha apenas um amigo em que realmente confiava: arlindo, um porteiro de um dos prédio que ficava na rua. arlindo era um senhor de 62 anos, negro, cabelos esbranquiçados. era meio gordinho, tinha uma voz grave e uma risada alta e engraçada. pegava o turno da madrugada nas segundas, quartas e sextas. sempre levava biscoito para gomes - que também sempre o esperava ansioso - e depois ficava sentado na escada do portão do prédio olhando a rua, fumando e fazendo cafuné no cão. como essa noite tava chovendo e era quarta-feira, arlindo abriu o portão e gomes veio andando, quase correndo, na chuva e entrou de baixo da proteção de aclirico transparente. sentaram na escada na parte de dentro do prédio e ficaram os dois olhando pelo portão vendo a rua e ouvindo chuva que caía forte. as poças iam se formando, um carro de vez em quando passando e jogando água pra cima da calçada, o poste com defeito que acendia e apagava. a madrugada foi ficando fria e arlindo pegou um pano velho que tinha no chão da guarita e passou no pelo meio molhado de gomes que abria os olhos devagar e rapidamente os fechava. ficavam alí; os dois, curtindo a companhia um do outro e a companhia de si mesmos. curtindo o silêncio e a paz da madrugada chuvosa. as horas iam passando e o dia ia nascendo com a mesma calma de todos os dias. algumas pessoas passavam de guarda-chuva, outras passavam correndo e se escondiam de baixo do ponto de ônibus, outras apenas caminhavam e não ligavam para o restinho da chuva fina que caía e nem molhava. deu seis horas, arlindo disse passando a mão na cabeça de gomes: 'brigado pela companhia mais uma vez, meu amigo', levantou-se e abriu o portão. gomes levantou em câmera lenta, se esticou feito um gato preguiçoso e saiu pelo portão. sentou na calçada com o olhar fixo em arlindo que andava e entrava na guarita. quando ele sumia atrás do vidro negro, gomes atravessava a rua bocejando e com passos lentos entrava novamente na sua caixa de papelão e dormia até que sentisse fome. às sete horas arlindo pegava a mochila e o guarda-chuva, esperava o ônibus, ia para casa e também dormia até a hora do almoço.

terça-feira, 28 de julho de 2009

liberdade é contraste.

antes de começar a ler, imagine-se com muita sede. uma sede árida e desesperadora. uma sede salgada e doce. imaginou? agora imagine-se bebendo um copo grande de água na temperatura que você considera perfeita. agora imagine-se bebendo vários copos desses um atrás do outro até quase se afogar. agora imagine-se sem vontade alguma de beber nada. agora imagine a sede novamente. agora imagine o infinito.


era um dia ensolarado e agitado. telma, trabalhava em uma loja de calçados populares e estava no café em frente a loja aproveitando seus 30 minutos de folga depois do almoço. faltavam dois dias pro seu aniversário de 25 anos que cairia na segunda quinta-feira do mês de julho. há uma semana atrás ela havia terminado um noivado de quatro meses com otaviano, dono de um bar movimentado do bairro em que morava. telma era uma mulher agitada e faladeira. adorava samba e cerveja. vivia no bar de otaviano e adorava as cortesias e os olhares dele. até que com o passar do tempo as coisas aconteceram como o previsto. telma, porém, depois de compromissada não modificou muito seus hábitos boêmios. continuava indo ao bar, ao samba. continuava bebendo e rebolando para todos que batiam um pandeiro bem batido. foi quando otaviano começou a sentir-se por demais enciumado e pediu telma em casamento. colocou no dedo dela uma aliança grande e dourada. ele esperava com isso afastar um pouco os olhares masculinos da energia libidinosa que telma exalava. telma não era bonita e nem tinha um corpo perfeito, mas tinha um olhar de canto de olho que acelerava qualquer samba. a aliança não adiantou muito. os amigos mais íntimos de otaviano até se afastaram um pouco e começaram a frequentar mais o bar da outra esquina. mas, no geral, o samba continuava quente e telma sempre cercada de batuques e olhares. otaviano cobrava e brigava com telma quase todos os dias. sem aceitar tais comportamentos do noivo, telma, depois de quatro meses, terminou o relacionamento. otaviano ainda era apaixonado e sabia que telma, provocante como era, não demoraria a arrumar um substituto. e, pior, o local do samba ainda continuava sendo sob o teto do seu estabelecimento. agora, otaviano além de continuar servindo cerveja, cachaça e tira-gosto para os homens que azaravam telma, não podia dizer nada, pois o dedo de telma estava vago.

o horário da folga acabou e telma saiu do café em direção à loja de calçados. ao atravessar a rua foi surpreendida com um puxão por trás. uma mão forte agarrava seu braço. era otaviano com os olhos vermelhos e molhados de lágrima. disse com a voz trêmula e com um hálito forte de cachaça: 'telma, eu ainda te amo'; e desabou em mais lágrimas. estava bebado e não conseguia se controlar. ela não esperava essa atitude no meio da tarde, mesmo sabendo do amor que otaviano ainda sentia. ela não sentia mais nada por ele. na verdade nunca sentiu nada tão forte. gostava mesmo era do conforto de ter o dono do bar como seu noivo. telma então disse: 'você está bêbado, quando curar a ressaca a gente converssa igual gente' (disse isso pois sabia que otaviano nunca diria aquilo sóbrio). virou as costas e, sem olhar para trás, entrou na loja de calçados. em seguida dois amigos de otaviano o pegaram pelo braço e o levaram de volta para o bar. dois dias se passaram e telma comemorou seu aniversário no samba do bar de otaviano. ela gostava de ver ele abaixando os olhos quando ela sambava perto de outro homem. ela gostava de provocar ciúmes e ter certeza de que era amada. otaviano se remoia internamente atrás do balcão. sentia seu coração doer. pra não demonstrar seus sentimentos, deu uma grade de cerveja para telma como presente de aniversário. o samba nesse dia durou a noite toda e telma foi embora de mãos dadas com o cara do pandeiro. otaviano fechou o bar às 6 da manhã e foi dormir. sonhou a noite toda com ela. primeiro sonhou que faziam amor; depois sonhou que ela fazia amor com três homens diferentes; depois sonhou que ela beijava o homem do pandeiro, depois sonhou com ela nua sentada em seu bar bebendo cerveja e mandando beijos. acordou com a mesma sensação de ciúmes de antes. eram 11 horas da manhã e otaviano não sentia fome. pegou uma cerveja na geladeira e bebeu sozinho no sofá de casa. levantou-se e saiu em direção ao bar. levantou o portão de ferro, e, enquanto ele passava um pano molhado no balcão uma mulher bonita e bem vestida, com a maquiagem borrada de quem parecia ter chorado, sentou numa das cadeiras altas que ficavam em frente ao balcão e pediu uma cerveja. otaviano escolheu a mais gelada e disse que era cortesia. nessa mesma hora telma passava em frente ao bar para ir almoçar no restaurante que ficava naquela mesma rua. como de costume olhou para o bar, e viu a moça de vestido azul marinho de costas, sentada conversando com otaviano que pegava um copo e sorria brindando com a moça. telma parou e olhou melhor, mas logo continuou andando para não deixar que otaviano a visse e percebesse sua expressão curiosa. não era só curiosidade. telma sentiu um frio na barriga e perdeu todo o apetite. continuou andando pensativa em direção ao restaurante, especulando possiveis diálogos para a cena do bar. chegou no restaurante e sentou-se. continuava pensativa e sem fome. agora sentia-se sozinha e cada vez mais ameaçada pelas próprias especulações. imaginava a moça de vestido azul recebendo as cortesias e os olhares de otaviano. surpreendia-se agora com seu próprio ciúme. queria otaviano de volta. levantou-se e saiu do restaurante em direção ao bar. nem sabia o que diria, mas estava determinada a ter toda a atenção de otaviano de volta. para sua surpresa a porta do bar estava fechada. otaviano nunca fechava na hora do almoço, principalmente numa sexta-feira. telma então caminhou com passos largos até a casa dele que também estava trancada. bateu na porta, mas não havia ninguem em casa. sentia-se agoniada e queria saber de qualquer forma onde ele estava. imaginada mil coisas, afinal, quando ela o viu, ele estava acompanhado de uma mulher aparentemente bonita, e, pior, estava feliz. sabia que por conta do término do noivado, ele estava fragilizado e carente. telma estava inquieta e se contorcia de ciumes. ficou andando de um lado para o outro na frente do portão da casa de otaviano até às 13. quando acabou seu horário de almoço, voltou para loja sem ter almoçado e com a cabeça a mil. ao final da tarde, saiu uma hora mais cedo da loja e correu ansiosa para o bar. quando chegou, o samba já estava animado. o cara do padeiro estava lá, como sempre. ele sorriu e se aproximou dela batendo o pandeiro com força. telma olhou para dentro do bar e a mulher de vestido azul estava sentada no balcão tomando uma cerveja e conversando com otaviano, que, ao mesmo tempo que servia as mesas e as pessoas, conversava animadamente com a mulher. o samba nessa noite não foi bom. telma estava quieta. ficou sentada e sem conversar muito. bebeu pouco e não comeu nada. otaviano, em um determinado momento, olhou para ela e percebeu os olhos abaixando. sentiu que telma não era tão segura assim. percebeu seu olhar ciumento e seu desânimo. essa cena se repetiu algumas vezes, até que otaviano pediu licença a moça de vestido azul, saiu de trás do balcão com os olhos fixos em telma, pegou-a pelo braço e deu nela o beijo mais apaixonado que pode. beijaram-se com os corações disparados e certos de que se amariam para sempre. ao final do beijo, otaviano deu a chave do bar para seu melhor amigo (que olhava com cara de desaprovação a cena de amor) e arrastou telma para sua casa. se amaram como loucos durante 2 meses inteiros - com samba, sem ciumes e sem cobranças. até que enjoaram de tanta certeza, pensaram ter descoberto a liberdade e decidiram terminar. o samba continuou como sempre: às vezes os olhares se cruzavam e otaviano deixava a chave do bar com o amigo; às vezes telma saia de mãos dadas com o cara do pandeiro e as vezes uma mulher bonita chegava chorando no balcão de otaviano. tudo continuava do mesmo jeito, agora, porém, além do cheiro de cerveja, suor, fritura e cachaça, além do som das batidas, dos copos brindando e das vozes altas, qualquer um que passava na frente do bar de otaviano ouvia no som do pandeiro (ta tudo muito bom, ta tudo muito bom, ta tudo muito bom) a liberdade e a leveza. mas a liberdade não vinha das sensações rasas e momentâneas que por alí sempre aconteceram; vinha da sensação de felicidade de sambar sem se preocupar com os olhares antes pesados; vinha da vontade saciada; vinha como a sensação de beber um copo de água depois de passar muita sede; vinha como um alívio. é claro que tempos depois tudo ficou muito leve e o peso fez falta, etc.
agora imagine o infinito.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

o orgulho.

eram 2:30 da madrugada e joanísio estava sentado em um ponto de ônibus de uma das principais avenidas da cidade. estava sozinho no ponto, e nas ruas só ouvia-se o barulho grave e constante do vento soprando os ouvidos. fazia frio, os machucados estavam expostos e dolorídos e a barriga reclamava de fome. estava desempregado desde que fora finalizada a construção da nova ponte da cidade, e vivia agora da renda de sua esposa que trabalhava como empregada doméstica nas residências nobres da cidade e do pouco dinheiro que seu filho ganhava como entregador de compras pelo armazem do bairro. joanísio estava andando pelas ruas desde às 21horas, horário em que foi expulso de casa: marta, sua esposa, chegou da igreja e o cobrou por não ter conseguido emprego novamente. joanísio, como de costume bateu nela, e, jones, seu filho interviu. após uma briga violenta entre pai e filho, joanísio foi expulso de casa e ameaçado de morte caso voltasse a aparecer. a violência sobre marta era uma prática que se repetia sempre, assim como a intervenção de seu filho. dessa vez, portanto, jonas estava disposto a matar seu próprio pai e deixou isso bem claro quando deu o último chute na barriga com os olhos vermelhos e o corpo todo arrepiado de raiva.
já passavam das 3 e joanísio não tinha para onde ir, estava com fome, frio e com o coração vazio de sentimentos. não sabia o que sentir. poderia sentir raiva do filho e da esposa, mas também sentia saudades de sua cama, dos carinhos de marta, da televisão pequena na sala e dos jogos de futebol que assistia com jones, torcedor do fluminense desde que nasceu e ganhou do pai uma roupinha do clube. o vento batia cada vez mais forte e joanísio abraçava os joelhos e continuava lembrando do feijão bem temperado que marta servia religiosamente no almoço e no jantar. remoia pensamentos, mas ao mesmo tempo não sentia nada. queria se arrepender, mas seu coração sempre foi muito orgulhoso. queria sentir raiva, mas era um sentimento que o machucava também. quando batia em marta não era por raiva dela, e sim raiva da vida, do mundo, de si mesmo. nem mesmo ele sabia explicar o porquê; mas sabia que a amava e que, agora, mais do que nunca, queria ela como sua esposa pelo resto de sua vida. talvez a quisesse muito agora por saber que não a tem mais. talvez se voltasse para o lar tudo voltaria a ser como antes: brigas, televisão, igreja, cobranças etc. talvez não.
os primeiros ônibus começavam a passar e jogavam o vento com mais força para cima de joanísio cheio de feridas internas e externas. com dores no corpo e no coração. com amor, saudade, dúvidas e orgulho. com vontade e sem coragem. com fome. estava jurado de morte, mas poderia jurar por deus que arrumaria um emprego e que nunca mais bateria em marta, desde que não precisasse admitir seu erro diante de seu ego e de seu filho.
com o corpo já anestesiado no auge da dor e dor frio, joanísio deitou-se atrás do ponto de ônibus onde o vento era mais fraco, colocou os braços para dentro da camisa e dormiu o pior sono de sua vida. de manhã cedo quando o ponto começava a ficar movimentado e o sol já esquentava, joanísio acordou assustado, levantou-se e caminhou para casa com a certeza de que todo o acontecido do dia anterior havia sido abafado por uma noite de sono. acordou com o orgulho renovado, com a convicção de que era o homem da casa e que apanhar para um filho e ser cobrado por uma esposa eram atitudes absurdas. acordou disposto a chegar em casa como se nada tivesse acontecido, como se as feridas de marta não estivessem mais doloridas, como se os olhos de jones estivessem serenos como de costume. acordou com a sensação de que tudo fora coisa de momento. estava com fome e andava para casa pensando no cheiro do almoço de marta. estava cansado e andava com passos firmes pensando na cama quente.
joanísio chegou em casa e gritou: 'marta .. abre o portão que esqueci minha chave'. por conta do horário, a rua ainda estava silenciosa. joanísio gritou novamente: 'marta!'. o silêncio o fazia sentir medo agora. começava a pensar novamente na possibilidade de estar errado. começava a repensar sua culpa, e na ameaça de morte feita pelo filho. nessa hora ouviu os dois giros da chave que abria a porta. jones saiu com um 38 na mão e deu 3 tiros determinados do peito do pai que caiu na calçada sangrando sem mais chances de se arrepender. marta estava olhando da janela e chorava. e continuou chorando por algumas semanas, até que as feridas cicatrizaram.
liberdade é poder prender-se até enjoar.
para cada dia/vida
um aglomerado
um emaranhado
uma profunda, confusa e difusa
mistura de sensações.

meus dias se resumem em esperar a eminente, latente, evidente explosão do meu mundo ou da minha cabeça (se é que existe diferença).
um dia diferente como sempre se vê por aqui. acorda-se tarde, almoça-se tarde, e quando o olho abre e olha pela janela buscando alguma beleza, o domingo já é quase segunda. um dia idêntico ao que vivi ontem. acorda-se tarde, almoça-se tarde, e quando pensa-se viver um pouco do que resta de alguma promessa, a vida já é quase morte. um dia bom como os que sempre surgem. olha-se para as coisas e entende-se coisas divergentes. esquece-se e vive-se ignorando a falta de sentido. as escalas não interferem tanto quanto a vontade. para qualquer lado que se olha, o infinito abraça. e, de uma forma ou de outra tudo é por causa de tudo.

domingo, 26 de julho de 2009


só um lembrete para escrever mais depois:

os últimos quatro dias pasaram como um ano ou mais, e melhor, contrariando completamente aquela lei de que coisas ruins tendem a passar mais lentamente que as boas.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

são exatamente 3:33
deveria estar dormindo, mas estou pensando.

lembranças significam muito para mim.


quinta-feira, 16 de julho de 2009

ta tudo meio solto, meio louco, meio sem cara, meio sem nome, meio sem cheiro, meio sem gosto, meio sem nada, meio de longe. ta tudo meio um pouco, meio esquecido, meio apagado, meio esquisito, meio cansado, meio dormindo, meio acordado, meio fingindo. tem nada de tão novo, tudo tão gasto, tão sujo, tão vago, tão nulo, tão vasto e imundo. tem nada de alvoroço, tudo ta quieto, silencioso, misterioso, atento, lento, reto. tem nada de gargalhada, ta tudo tão morto, tão frio e vazio. tudo meio sem graça, meio sem vontade, meio sem fome, meio sem nada. tudo meio sem nota, sem ginga, sem rima, sem samba, sem bola, sem nego, sem branco, sem índio, sem santo. ta tudo meio sem cor, meio sem dor, sem calor. tudo meio sem tato, opaco, estático, apático, mórbido. tudo muito lógico, quadrado, medido, cuidadosamente calculado e conferido, desastrosamente generalizado e consentido, religiosamente praticado e repetido. ta tudo ali, logo ali, quase lá, mais pra cá. ta tudo tão por pouco, muito pouco, só um pouco mais. ta tudo tão pra mais, tão pra menos, tão pra fora, tão pra dentro. ta tudo tão perdido, tão sem jeito, tão aceito. ta tudo sem sentido, rigorosamente planejado e garantido, compulsoriamente reafirmado e ingerido. consequentemente destruído.
aos poucos concluo que a minha imaginação é responsável por muito mais da metade de tudo o que acontece realmente. aos poucos venho percebendo que a propaganda, o exagero e a vulgaridade - mesmo que sutis - são, juntos, uma forma de instigar a imaginação a perceber o que poderia ter existido - se as coisas acontecessem como são ditas - mas não existiu. por trás das banalidades, a imaginação cria o idealizado, o impossível e o provável; mas, na frente da ato, a boca fecha, o tempo para e as vozes são ouvidas muito mais claras, diretas e intensas. as vezes acho que inconscientemente tenho/temos medo de banalizar os meus/nossos verdadeiros feitos, sentimentos etc. por isso, aos poucos venho achado que a extrema negação, a omissão e o silêncio deixam a verdade muito mais sincera - embora, as vezes de forma oposta.

na verdade, acho tudo isso uma grande besteira que escrevi apenas para tentar acalmar minha imaginação desvairada.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

nada sai daqui de dentro sem um pouco de risos ou lágrimas. nada entra daqui pra o sempre com um pedido de permissão. tudo que eu acho que é, já está sendo a tempo suficiente pra eu esquecer do que lembrar. meus olhos sempre serão atrasados demais para as cores que eu não preciso enxergar. meus ouvidos nunca serão aguçados o bastante para ouvir os segredos que me fazem um ser curioso e, por isso, limitado: só não sei o que quero saber. meu mundo sempre será grande o suficiente para viver e pequeno demais para suportar. as coisas se bastam e, por isso, entendem tudo: só sei o que não me interessa saber. nós não nos bastamos, então inventamos o infinito. portanto, se não saber é o que resta, vou tomar um comprimido e tentar dormir.
constantemente sinto medo de estar enlouquecendo e, a única coisa que me conforta desses pensamentos é a lembrança de alguém me dizendo um dia: loucos não pensam que são loucos ou que estão enlouquecendo. a partir disso tenho me visto dentro de um paradoxo, pois ultimamente tenho achado que o pensamento anda tomando muito espaço da realidade, não só no meu mundo, mas também nos mundos que contrastam com o meu. daí, ao mesmo tempo que quero evitar pensar tanto nas coisas e em mim, estou aqui mais uma vez pensando e refletindo sobre pontos que eu mesmo contrapus para pensar sobre minha vida e sobre as coisas que acredito. meu deus, como sou contraditório! também lembro de ter ouvido de alguém algo sobre contradição: contradição é a mais exclusiva característica humana; ser contraditório é ser humano. então ... esquece.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

quando a falta de sentido se torna vida:
hoje, parado no trânsito das 18 na reta da penha, olhei pela janela do ônibus e senti meu coração parado. senti meu sangue coagulado e meus pensamentos ficando dormentes. olhava para as pessoas nos assentos ao lado, para as pessoas sozinhas nos carros ligados, para as pessoas esperando nos pontos de ônibus lotados. e, pude sentir em todos, como em um sentimento único e sólido, uma vontade de não viver, de não ser, de não ter que estar assistindo sob o céu cinza de inverno, sobre o asfalto gelado desse deserto, essa vida de possibilidades infinitas, sendo agora travada, morta nas ruas silenciosas de sons difusos e sem musicalidade. ainda faltavam alguns pontos até a minha parada, e pela quantidade de buzinas no ar, ainda ficaria longos minutos ali parado. então recostei a cabeça no assento da frente e fechei os olhos. acordei segundos depois pensando que havia dormido muito, e com a sensação de ter tido um sonho confuso. aos poucos fui me lembrando do sonho. foi quando acordei assustado dois pontos depois meu.

domingo, 12 de julho de 2009

www.myspace.com/eternidadinstantanea


será que é possível entender alguma coisa nessa porra desse mundo absurdo? será que é possível entender essa porra de coração que me acorda no meio da noite como se estivesse apaixonado? será que eu preciso mesmo dessas tantas respostas ou perguntas que giram de mãos dadas ao meu redor nesse ritual infinito? será que eu gosto de você ou apenas quero isso? será que você gosta de mim e não quer isso? será que gostamos de nós mesmos e não sustentamos isso? será que é tudo verdade e esquecemos como se acredita?

hoje é domingo e estou de ressaca. minha mãe assiste televisão no quarto e meu pai na sala. consigo escutar pássaros, alarmes e o silêncio da cidade inteira. hoje é domingo e ao invés de eu mergulhar e me afogar nesse marasmo sem cor, fico olhando pela janela esperando a segunda feira. será que tudo é mentira e ficamos girando como tontos por esses ciclos que giram nossa vida? o que há de errado com o domingo? por que o ar fica mais leve e as ruas silenciosas? por que meu coração não deita, dorme, aceita? não sei, e preciso não querer saber. mas tenho vontade de rir, pois fico bem sentindo qualquer coisa forte.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

o silêncio deixa a música boa,
a sujeira deixa o banho demorado,
o cansasso deixa a cama gostosa,
a fome deixa o arroz temperado,
o solidão sempre anda com o amor ao lado,
o livro ensina a não saber,
o frio torna o abraço apertado,
a noite existe pro sol nascer.
é do contraste que se faz vida.




terça-feira, 7 de julho de 2009

sinto vontade de escrever, mas não tenho nada pra dizer.
são 3 da madrugada. meu relógio biológico está doido por causa do final de período. tenho que entregar um portfólio de desenhos quinta; hoje é quarta e não tenho nem metade deles (acabei de desenhar um bule sujo de café). na televisão desligada falam de michael jackson. na rua, o cachorro do vizinho late sem parar. em cima da minha cama, um violão, livro feliz ano novo, pedaços dos lapis apontados, controle da televisão, uma maçã que vou desenhar daqui a pouco e meu travesseiro. no chão, algumas roupas, meu chinelo, um copo de água pela metade e o celular/despertador. na televisão continuam falando de michael, aposto. o cachorro ainda late la fora; deve ter alguém tentando assaltar a casa, só pode. bom, vou desenhar essa maçã. são 3:23.
ps: gosto desse silêncio.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

o bom de estar vazio
é ter espaço para qualquer coisa.


arquitetos da rotina II

coisas se repetem mais do que se imagina
repetições se repetem mais do que se imagina
imaginações se repetem mais do que se imagina
coisas se repetem mais quando se imagina
repetições se repetem mais quando
imaginações
coisas
repetições se repetem.

arquitetos da rotina

logo ali.

depois de acordar
depois de um café
depois de ir ao banheiro
depois do jornal
depois do almoço
depois das duas
depois do sol
depois de nunca

logo.

ali.

acordar
um café
banheiro
jornal
almoço
duas
sol
nunca

quarta-feira, 1 de julho de 2009


Hoje acordei querendo fazer todas as coisas de uma vez e com vontade de ser feliz para todas as direções. Acordei com vontade de sentir por todos os sentidos o mais profundo dos prazeres, e amar de formas platônicas cada detalhe que meu olho perceber. Hoje acordei com vontade de conhecer lugares novos e pessoas novas. Com vontade de rever parentes distantes e relembrar o gosto do feijão da minha avó. Levantei com os dois pés no chão e quis escrever um livro e quis ler um outro livro; quis praticar um esporte e ficar deitado ouvindo o canto de todos os pássaros. Queria ligar o ventilador e entrar de baixo do edredom. Acordei com vontade de beber café, de me embriagar e chorar no silêncio de um ombro. Acordei com ânsia de vômito e com vontade de ir a feira comprar o almoço. Hoje acordei com vontade de ter um filho e de comprar um cachorro. Queria mesmo era levar meu filho pra pescar e aprender a andar de bicicleta. Nessa manhã acordei pensando em divórcio e com vontade de fugir com a minha mãe e mostrar para ela o tamanho do mundo e dar a ela o meu abraço mais sincero. Hoje acordei com vontade de correr na praia e tomar uma cerveja no primeiro convite. Hoje acordei com vontade de aprender a tocar flauta e montar uma banda. Queria telefonar para minha ex-namorada e dizer pra ela largar o noivo e acampar comigo no quintal. Hoje queria jejuar, rezar um terço e mais tarde ir à macumba. Queria investir todo o meu dinheiro na sorte e ir morar numa aldeia indígena. Hoje acordei querendo comprar roupas novas, um presente para meu pai e fumar um cigarro no estacionamento. Queria jogar toda minha roupa na fogueira e viver para o resto da vida numa praia deserta. Hoje acordei com vontade de protestar contra o aumento da passagem e contra a superprodução das multinacionais. Hoje quis um aumento salarial e depois pedir demissão. Hoje acordei com vontade de comprar uma máquina fotográfica profissional e viajar pra áfrica, fotografar a pobreza do mundo e depois beber o vinho mais caro de Portugal, depois a cerveja mais clássica da Alemanha, depois fazer sexo com a prostituta mais cara de Amsterdã, depois conhecer os museus da Grécia e mais tarde quem sabe um café em Paris vendo o sol se por entre o charme nostálgico dos filmes. Hoje acordei com vontade de ir ao cinema e comer chocolate amargo. Hoje acordei para ver o sol nascer e depois subir e se por. Hoje acordei pra ver as nuvens e beijar a boca da minha amada esposa. Hoje vou parar de fumar e virar vegetariano. Hoje vou vender meu carro e comprar uma bicicleta. Hoje vou acabar com essa dieta que ta me deprimindo e vou levar minha família pra almoçar numa churrascaria. Hoje acordei com preguiça e vou pedir uma pizza e vou pedir um atestado pra não ir trabalhar. Hoje vou acordar cedo e meditar. Hoje quero dar bom dia para as pessoas na rua, no ônibus, no trabalho. Hoje acordei de mau humor e vou vestir uma roupa preta. Hoje eu vou plantar uma árvore e começar um romance. Hoje vou começar o curso de italiano e chamar aquela professora de piano que sempre passa por mim. Hoje vou ler Cem Anos de Solidão e depois vou comprar uma revista pornô na banca da esquina. Hoje vou me masturbar três vezes pensando em toda minha adolescência. Hoje vou pedir minha amante em casamento e de uma vez por todas terminar de pagar esse carro. Hoje acordei decidido a tentar vestibular. Hoje o sol nasceu diferente. Hoje olhei pela janela de manhã e senti uma vontade louca de viver o resto da minha vida nas primeira 24 horas. Hoje eu acordei chorando de felicidade. Hoje e acordei e percebi que o melhor que podia fazer era voltar a dormir e esperar a sorte de um sonho emocionante.

terça-feira, 30 de junho de 2009

http://www.youtube.com/watch?v=tarvCZ94U5Q

só de pensar nas possibilidades me afogo em quase ações. por maior que seja nossa insistência em controlar alguma coisa, uma atmosfera sensivelmente emaranhada nos envolve e nos mostra o quão curto são nossos pensamentos, o quão pouco podemos, o quão limitada é a nossa carne, o quão certo é nosso erro. por mais que tentemos ignorar nossa ligação com cada detalhe desse mundo, sempre existirá uma corda amarrada em nosso tornozelo nos puxando para a irracionalidade, que, ao meu ver, é o lugar de onde nunca deveríamos ter saído; ou melhor, nunca deveríamos ter pensado que sairíamos; ou, melhor ainda, nunca deveríamos ter pensado que pensamos; mas - já que acho que penso - pensando bem, nem acho que o pior seja o que já foi, até porque seria uma idiotice pensar que toda razão exista apenas na memória. o erro que vejo exaustivamente se repetindo em mim e ao meu redor, é a criação de uma expectativa sobre uma base claramente fantasiada em uma mentira óbvia. talvez essa mentira seja tão óbvia que nos torna inocentes. talvez essa mentira tenha sido tão bem contada que nos acomoda. talvez essa mentira esteja tão abraçada, tão enraizada, que seja difícil eviscerá-la. talvez essa mentira seja tão única, que tomâmo-la como cotidiana e essencial mesmo conhecendo seu fracasso. sinto-me óbvio escrevedo isso, e mais óbvio ainda aceitando. às vezes acho que só consigo viver por não acreditar em estabilidade.

domingo, 28 de junho de 2009



qualquer tipo de silêncio.
que seja um silêncio de quem não tem o que dizer,
que seja um silêncio de quem não tem com quem falar,
que seja um silêncio de quem se recusa a ouvir,
ou um silêncio que se forma quando se cansa de gritar.

preciso ouvir o que o silêncio me diz.