terça-feira, 19 de janeiro de 2010

conversa de verão.
duas senhoras no ponto de ônibus no centro da cidade:
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- ta quente né menina?!
- num é?! um calor diferente. deus me livre.
- o ônibus ta demorando hoje...
- a marta deve ta me esperando lá, tadinha. atrasei o almoço hoje, acabei perdendo a hora. ela vai sair e eu vou ficar com o vitinho. o menino cresceu, cê precisa vê. ta esperto o danado.
- ta estudando já?
- ta na creche. fica o dia todo lá. com a marta trabalhando agora né?!
- é... ta trabalhando ela, né?!
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- e seu marido, tá bem?
- ta bem. hoje ele foi cedo lá ver o negócio da aposentadoria. se deus quiser vai dar tudo certo.
- se deus quiser! eu te falei que consegui? graças a deus, menina. demorou mas saiu.
- você disse. graças a deus.
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- você viu no jornal de ontem que coisa triste? o filho que espancou a mãe pra roubar dinheiro. jesus do céu, que mundo é esse, meu deus?!
- deus me livre, vi não. tem tempo que não vejo jornal.
- esse mundo ta perdido .. é a droga né?! ta acabando com tudo.
- viu o filho de zefa? parece que ta usando crack agora também.
- tadinha de zefa com aquele filho dela. só deus mesmo.
- deus vai dar força pra ela, se deus quiser.
- a gente tem é que rezar muito, pedir muita força.
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- acho que é o meu que ta vindo alí, num é? tchau, lurdes. fica com deus.
- tchau! vai com deus.

...

- que calor é esse, jesus? cadê esse ônibus que não vem?
agora as sombras já estão ficando amareladas e a noite não vai demorar muito pra chegar. depois as milhares de janelas que posso ver daqui vão começar a piscar todas em rítmos muito parecidos. vai ser uma noite quente e com vento fraco. as estrelas não vão aparecer, pois têm vergonha de se mostrar na claridade das nossas ruas perigosas. acho que a lua não vai aparecer também, e se aparecer ficará por trás de algum prédio. as avenidas devem estar paradas com pessoas enfileiradas e solitárias cada uma dentro de sua caixa isolante. outro tanto de pessoas devem estar se esfregando ou cochilando dentro de um ônibus parado esperando com a calma de uma rotina milimetricamente calculada o seu ponto, a sua casa, a sua família, a sua janta, a sua cama. alguns cachorros começaram a latir na minha rua e o bar da esquina começou a tocar música alta. é terça-feira, janeiro, verão.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

tudo que sei
é tudo que sinto
é tudo que acredito
é tudo que abraço.
o que não sinto
é tudo que não sei
é tudo um talvez
que eu não posso abraçar.
mas as vezes só penso
e consigo sentir
e mesmo sem ver
consigo acreditar
e saber
porque tudo que sei
é tudo que sinto
é tudo que acredito
é tudo que abraço.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

do que já não é somente só

as coisas mudam
continuam ligadas
opostas ou diferentes
e na mesma direção

as coisas parecem
se desligar e sufoca o coração
a mão molhada de suor
lágrimas ou saudades
do que já não é somente só

mas as coisas sempre continuam
de mãos dadas com as velhas vontades
mesmo longe da novidade
fazendo parte até da respiração

e como as coisas mudam e continuam mudando ligadas
eu me desligo

sábado, 9 de janeiro de 2010


às vezes quero andar sem pensar
mas o pensamento quer andar e pensar sozinho.
quero andar mais lento
mas o coração atormenta
com o mais simples sinal de repetição
e quando os olhos já não têm mais o que ver
pra quem olhar, algum motivo para fechar
o sangue ferve e a flor da pele desabrocha
o pensamento corre na frente
some da vista e eu não vejo mais nada.