domingo, 2 de agosto de 2009

o rio e as pedras.

no meio do fluxo da correnteza do centro da cidade ele sentiu uma vontade súbita de olhar para o céu. sentia vontade mas parecia não ter coragem. era final de tarde e as pessoas pareciam apostar corrida para chegar em seus lares. parou no canto da calçada e algumas pessoas esbarravam no seu ombro como as águas de um rio empurram as pedras que param. sentiu-se travado. o rio parecia determinado a arrastá-lo correnteza abaixo e ele continuou andando. fazia calor. ele usava calça, sapatos e uma blusa social de manga comprida cor azul-marinho como exigia seu emprego. seu corpo e seus pensamentos se encontravam num cansaço acumulado que refletia claramente nos seus olhos opacos. ouvia-se um barulho único feito de vozes, gritos, passos, respirações pesadas, motores e buzinas. via-se também uma cor única formada por roupas multicoloridas, pessoas multicoloridas, carros multicoloridos, um asfalto e paredes cinzas. por mais que ele quisesse, ao fim de mais um dia, se abster de qualquer pensamento, uma vontade agora constante o fazia querer olhar para o céu. então parou no canto da calçada novamente. dessa vez mais seguro, ele colocou a mão na parede descascada de uma loja de eletrodomésticos empueirados, fechou os olhos, suspirou profundamente e olhou para cima. por mais que os edifícios quisessem, numa perspectiva até o infinito, tapar o céu, ele ainda estaria lá, azul e sublime com suas nuvens borradas de branco acinzentado de final de tarde. ele ignorou os edifícios, fixou os olhos no céu, e, de uma só vez todas as multicores que o enchiam de direções e o entupiam de sensações, deram lugar ao azul claro que o fazia piscar os olhos agora com calma e respirar mais suavemente. os barulhos sumiram e ele sorriu com uma respiração profunda de alívio; sentiu um calafrio bom pelo corpo e o calor também deu lugar à uma brisa suave de final de tarde; sentia-se como alguém que chega à superfície da água depois de quase morrer afogado; sorria como bobo; sorria como quem não acreditava e descobre. uma mulher, com o mesmo olhar de final de expediente, corpo cansado e saturado de tanto acúmulo, passava por ele na mesma calçada. o viu olhando para cima e sorrindo, e, mesmo sem saber o porquê, também olhou curiosa. num instante os dois estavam como duas crianças rindo com os olhos fixos no céu. outras pessoas que também passavam perto ficaram curiosas e olharam; e descobriam, uma a uma, o alívio do não afogamento. mais um instante e já eram 7 pessoas olhando para o céu e rindo. logo eram 15. as pessoas saíam curiosas das lojas; outras colocavam a cabeça para fora dos carro, dos ônibus, das janelas dos edifícios. mais um instante e um quarteirão inteiro de pessoas estava parado e rindo. o rio estava parado. o rio estava parado! mais um instante,e , devagar as pessoas foram abaixando a cabeça, sentindo-se apressadas novamente e voltavam a andar. num instante seguinte o fluxo corria novamente como há dois minutos atrás. as multicores, o som único de todas as coisas acumuladas, o cansaço corporal e mental, a vontade de chegar em casa; tudo ia voltando. o rio voltara a correr normalmente. o rio voltara a correr novamente!

2 comentários:

  1. maravilha! apresente, faz favor, esse moço à rita, que ela está precisando. hehe!

    adorei as imagens!! adorei! isso dava um curta massa! tou aqui imaginando tudo.

    beijo, chuchu!

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  2. É ainda um privilégio poder olhar pro céu e ver mais que fuligem e o topo dos edifícios...
    Poder olhar o céu tendo por bússola suas palavras.
    Muito bom!!!
    PAZ!!!

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